Ambição Motora


Ele se perguntava se era real, se haveria sido real alguma vez. As memórias eram indistintas, apenas vagas coleções de coisas que ele não compreendia. Memórias desaparecem com o tempo. Magia desaparece com o tempo.

Por mais que ele desejasse se apegar àquele lugar e àquelas lembranças, ele não conseguia. Amigos sumiam, como se nunca tivessem existido. Talvez eles nunca tivessem existido.
Talvez tudo fosse um sonho, tudo uma esperançosa, falsa fantasia.

Podia ser uma mentira. Todo o mundo era mentiras. Mentiras sobrepondo umas às outras até que alguma forma de verdade surgisse. Mas não havia uma verdade real, apenas locais onde um número suficiente de mentiras se reuniam.
Todo o mundo estava conectado, todas as pessoas conectadas.
E ele sozinho estava separado e distante.

Uma vez ele amara, uma vez ele vivera. Ele não se lembrava quem, como, ou por que, mas ele se lembrava que sim. E aquilo o matou.

Ver através dos próprios olhos dele um frágil mundo quebrado. Um que não tinha lugar para ele. Era tudo tão confundido, tão confuso que ele não desejava classificá-lo.
Ele apenas queria um lugar para ele.

Então ele o fez. E tudo mais. Antes que algo pudesse machuca-lo. Antes que algo pudesse fazê-lo sofrer. Tudo era dor. Tudo causava dor.

Era por isso que todo mundo tinha que ver. Eles não eram confiáveis. Nada era. Nada além do que ele criasse e construísse com suas próprias mãos. Mas eles necessitavam ver.
Então ele, ao menos, os faria ver.

O mundo o deixou amargo. Ele o deixou louco.
Mas estava tudo bem, o mundo dele era o único que importava.
O mundo dele poderia se compreender em apenas um momento de iluminação plena.
Uma utopia transcendental.

Alguns pensavam que ele era maligno. Um monstro. Destruindo por prazer.
Mas não. Era o mais sincero altruísmo.
Ele não permitiria que o mundo o segregasse novamente, que o ostracizasse novamente.
O mundo inteiro iria perecer, e ele sozinha sobreviveria. Mas ele não desejava estar sozinho. Ninguém desejava estar sozinho.

Então ele tornaria seu mundo a realidade crua, e a cruel realidade na fantasia final.

Ninguém o amava. Ninguém o compreendia. O mundo inteiro era seu inimigo, porque o mundo inteiro não compreendia. Porque ninguém poderia compreender.

Então ele faria o mundo se compreender diante dele. Tudo se tornaria um momento apenas, e esse momento seria o momento da verdadeira iluminação. Quando todo o mundo seria capaz de vê-lo e de amá-lo, e de adorá-lo, pois aquele seria o mundo dele, e todos seriam aquele momento, exceto ele, que seria livre afinal.

Então ele lutou por sua liberdade. Ele lutou, mas pelo que ele estava lutando mesmo?
Ele não mais compreendia. E ele cansara de lutar.
Cansara de procurar por algo que eventualmente lhe seria negado de novo.
Tempo, memórias, amizades, esperanças, sonhos...
Ele cansara de lutar por coisas tão insípidas.

Ele jamais teria imaginado que a morte seria o momento de maior liberdade.
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